O ser humano sintetiza a emoção e a vida.
A sua linguagem no espaço, ou somente em um determinado espaço, é absolutamente livre. Comporta equilíbrios e desequilíbrios.
A sua primeira forma concreta de ação é ir para frente, sem perder a mobilidade, sem deixar de agir, sem deixar de viver.
Evidencia-se em sua trajetória a alegria, a felicidade, o desespero, a angústia, a solidão, a dúvida, a fé, o desejo de aniquilamento e a vontade de vencer.
Reflete conflitos, causa impacto.
Seu corpo atua como espaço de resistência e liberdade.
O fluxo contínuo que lhe é imposto estabelece a qualidade de suas relações.
Vejo o ser humano como figura central, principal em nosso mundo. Aquele que constrói, destrói e preserva.
Não procuro a exatidão dos modelos reais e sim privilegiar o gesto que define o corpo como forma, o olhar, a expressão e os traços marcantes do rosto.
A figura humana foi uma escolha natural. Surgiu em meu trabalho e foi ganhando espaço. Interessam-me as suas qualidades, suas imperfeições e as suas inúmeras possibilidades de expressão.
Márcia Guimarães
Abril de 2000















“Eu vejo o ser humano como figura central, principal em nosso mundo.
Aquele que constrói, destrói e preserva.
Me interessam as suas qualidades,
Suas imperfeições e as suas inúmeras possibilidades de expressão.”.
Márcia Guimarães
“Portraits”
O homem, a mulher – o ser humano. Este é o núcleo dos 16 trabalhos desta primeira mostra de Márcia Guimarães. Resultado de um longo caminho interior e de uma trajetória de estudos, em cujo percurso materiais foram sendo reconhecidos e reelaborados na construção de uma linguagem própria.
Assim, o encontro com o pastel oleoso e o guache, a descoberta das cores fortes e da densidade das camadas e misturas, convergem para uma escritura essencial: – a do objeto artístico. A figura humana.
E as figuras de Márcia falam por uma gramática particular. São retratos que desconstroem a exatidão dos seus modelos reais e que não se submetem a concretude da efígie, a evidência espetacular do corpo e do rosto.
Talvez, por isso, a expressividade de suas representações se revele como condição decifratória: – são imagens que privilegiam a harmonia da composição, mas em reciprocidade direta com uma intencionalidade temática.
O traço, perceptivelmente brusco, incisivo, às vezes evoca uma interrupção, ou um retorno sobre si mesmo, pontuando uma busca obsessiva de compreender o lugar e o espaço da figura humana, enquanto Ser-no-mundo, em confronto com sua própria finitude.
Os ângulos são efetivamente cortes – ou recortes que marcam a cisão entre a corporeidade e a idealidade. Márcia retrata a imperfeição, a falta, o Homem fragmentado, cindido, cujo olhar ora centra-se nele mesmo, ora perde-se no tempo. O detalhe, o pormenor é uma desrealidade. Desse modo, cada figura, cada relação espacial, pode significar qualquer coisa.
Tentei desfazer-me de concepções e análises da criação artística. Em vão. Não escapo da rede de palavras, buscando de algum modo nomear as imagens, ou explicar o que elas me devolvem, o ponto que nelas me retém e que, em sua instância, re-significam a oferta de uma tentativa de formular perguntas para a existência. Afinal, na arte encontramos nossos ecos interrogantes, ainda que sob o desafio de interrogar nossa emoção.
Nessa aventura de ver, de ler, de sentir os retratos de Márcia, encontrei, e reencontro, a cada nova mirada, puras metáforas da existência. Signos de prazer visual. Por isso, não obstante minha proximidade afetiva com a artista me senti com grande liberdade para fazer essa leitura de seus ‘portraits’, retratos expressivos, intitulados por ela de Figurações.
Thais Guimarães

