Bestiário
Quando criança, adorava me ocupar com as coisas da natureza. Possuía o conhecimento dos pequenos seres com os quais me ocupava e que habitavam o meu mundo.
Criaturas imaginárias, belas e fantásticas, entes complexos, que faziam parte da minha infância e moravam no quintal da casa em que fui criada.
Perdi este conhecimento com o tempo, ou talvez este conhecimento pertencesse a meu eu criança, conduzindo a minha imaginação e estabelecendo paralelos entre o mundo real e o imaginário, mas a memória permanece.
Seres alados, misteriosos, brilhantes, sombrios, metade humanos metade bichos. Pequenos e delicados.
Via e não via, mas acho que o que não via era mais importante do que o real.
Era um mundo tão atraente que não me contentava com as espécies existentes no espaço em que vivia. Preenchia-o com espécies novas que ocupavam um lugar privilegiado no meu reino animal.
Os vegetais também tinham o seu lugar. Associados aos animais transformavam-se em criaturas fantásticas, comestíveis ou não já que eu adorava cozinhar em um fogão de lenha que os meus irmãos construíram para mim no quintal.
Tatus-bola voadores, minhocas que quando divididas cresciam cabeça e rabo, lesmas que odiavam sal, caracóis que se escondiam dentro da concha quando me aproximava.
Não gostava muito dos bichos da noite, com exceção dos que criava. Estes geralmente eram brilhantes, luminosos, cheios de vida e de alegria e não precisavam da luz alheia.
Pulava e brincava com cachorros, gatos, com a maritaca, com o mico estrela, irritava a Madalena, a arara mais linda que já existiu neste mundo, com os coelhos e os porquinhos da índia. Tínhamos também um galinheiro e um pombal, e os bichos novos criados e imaginados, mas nem por isso menos reais.
Gostava de criar sozinha e de pensar que as minhas criações eram maravilhosas. Desenhava estes seres em cima das modelos das revistas de moda da minha mãe.
Ficava quieta durante horas.
E assim fui montando o meu “Bestiário”, tratado de seres fantásticos criados em sonhos de olhos abertos.
– Os bestiários remontam a lendas indianas, hebraicas e egípcias compiladas na Grécia como pshysiologus, história natural com ambições científicas, traduzida para o latim no século IX.
– Participação na exposição coletiva “Um Erro Inesperado Aconteceu”, na galeria Periscópio
– Curadoria de Nydia Negromonte e Marcelo Drummond.
– Trabalho realizado a nanquim e bico de pena
